A Era da ignorância

O filósofo grego Hesíodo foi um dos primeiros a descrever as “Eras do homem”, em sua obra “Os trabalhos e os dias”. Segundo ele, a raça humana, depois de criada, teria passado por “cinco eras” ou “idades”, cada qual com uma raça correspondente: A Era de Ouro, a Era de Prata, a era de Bronze, a Era dos Herois e a Era de Ferro.

Baseado nesse conceito, anos mais tarde, o escritor latino Ovídio compôs sua mais famosa obra, “Metamorfoses”, suprimindo apenas a “Era Heróica/dos Herois”.

Segundo os autores, a humanidade passou, primeiramente, pela “Era de Ouro”, vivendo livre de sofrimentos. Em seguida, veio a “Era de Prata”, quando nossos ancestrais descem das árvores e deixam as cavernas, de modo que tornou-se necessária a invenção de casas e o desenvolvimento da agricultura. A próxima etapa foi a “Era de Bronze”, quando Zeus cria então uma terceira raça de homens perecíveis. Em seguida surge a “Era dos heróis”, que combateram em Tebas e em Tróia. Finalmente, vem o duro tempo da “Era de ferro”, que dura até hoje – tempos de incessantes misérias e angústias, mas quando “ainda alguns bens são misturados aos males”. A essa raça aguardam dias terríveis: “o pai não mais se assemelhará ao filho, nem o filho ao pai, o hóspede não será mais caro a seu hospedeiro, nem o amigo a seu amigo, nem o irmão a seu irmão”. Após a morte iam para o Hades e lá permaneciam como sombras, os considerados justos iam para os Campos Elísios – onde ficavam 1000 anos até se apagar o que de terreno havia neles -, depois disto esqueciam toda a sua existência e segundo alguns reencarnavam e segundo outros realizavam a metempsicose (reencarnação em animais). Os Injustos iam para o Tártaro para toda a eternidade.

Eis a base de toda a nossa cultura ocidental, que mais tarde foi introduzida pelo apóstolo Paulo no seio das comunidades judaicas, seguidores de uma seita nazarena, liderada por um suposto messiah (ungido) conhecido como Yehoshua ben Youssef (que em latim passou a se chamar, Jesus filho de José).

Realmente me preocupa o que virá depois desse tempo, ou melhor, o que já está acontecendo – se levarmos em conta que, de uma Era para outra, não houve interrupções bruscas, mas transitoriedade – de modo que já podemos perceber certas mudanças à nossa volta, tais como certos avanços científicos e de pensamento de uma forma geral, mas que, paradoxalmente parece estar deixando a humanidade cada vez mais burra!

A informática pensa por nós e ficamos com os neurônios atrofiados. As câmeras de vídeo vigiam por nós e nos vigiam, nos privando de nossa liberdade privativa. Autofalantes e microfones são agora nossas bocas e ouvidos, numa Era em que ninguém parece ter nada a dizer. Nossas amizades deixaram de ser qualificadas para serem quantificadas em redes sociais cada vez mais invasivas, com seus interesses mercadológicos. Os livros são lidos cada vez menos e a desculpa para a falta de leitura é a rapidez com que as informações circulam na internet (ninguém se aprofunda em nada e quer ser especialista em tudo). Nessa nova Era, o amor ficou banalizado (tanto em significado léxico quanto em sentimento). Atualmente, “eu te amo” é dito para qualquer um que se acaba de conhecer numa rede social e se deixa de amar com a mesma rapidez de um “block”. Antigamente, quando algum assunto polêmico surgia, era comum que as pessoas perdessem muito tempo discutindo de forma acalorada, às vezes terminando no tapa. Agora é mais fácil pesquisar a resposta no Google (o nosso oráculo de Delfos da atualidade). Ninguém mais precisa pensar para discutir e os debates conscientes viraram lembrança. E por aí vai.

No fim das contas, o meu maior medo não é o que acontecerá comigo, mas com meus filhos e netos, que poderão passar a viver num mundo ainda mais sem sentido do que este em que sobrevivo agora…

6 comentários sobre “A Era da ignorância

    • Querida Cláudia,

      Penso que todos nós somos responsáveisi pelas gerações futuras, quer tenhamos filhos ou não. Vejo que o que mais importa nesse contexto todo é o legado que a nossa civilização contemporânea deixará para as próximas. Porque, das duas uma, ou seremos eternamente lembrados como uma humanidade decadente e mesquinha, ou simplesmente seremos deletados da História…

  1. Por mais que esta era nos engula, ou façamos verdadeiramente parte dela e de suas futilidades, ainda há poucos momentos onde existam reflexões profundas… como esta sua. Que nos remete a uma viagem no tempo e na consciência do quão raso nos somos. Obrigada pelo texto. Perfeito!

    • Obrigado, meu amor.

      O que verdadeiramente me preocupa (e que me motivou a escrever esse texto) é o fato da ignorância estar sendo tão exacerbada nos dias atuais que a gente ainda escuta “pérolas” como aquela do cara que descobriu que podia baixar CDs de graça na net e parecia que havia descoberto a roda! É esse analfabetismo funcional que me inquieta.

      Bjo grande!

  2. QUANDO PASSEIO PELA INTERNET ME SINTO COMO UM CATADOR DE RECICLAVEIS.ESCAFUNCHO O LIXO QUE ENCONTRO ATE ACHAR ALGO APROVEITAVEL.
    BOM SABER QUE AINDA TEMOS PELO PLANETA SERES COM CERTA INTELIGENCIA ,CAPAZES DE SE COMUNICAR EM DIVERSAS AREAS DO CONHECIMENTO.
    GOSTO MUITO DESTE ASSUNTO MAS TENHO ME LIMITADO A

    PESQUISAR SOZINHO.FOI BOM TER ENCONTRADO VOCES AQUI.

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